Queria eu, um dia, parar um estranho – aquele belo, naturalmente,
intrinsecamente belo – e perguntar-lhe como é ser belo desse jeito. Como é ser
desejado. Qual desejo esconde-se atrás do desejo alheio, aquele que atinge-o a
cada instante, de todos os lados. Quero saber também (e por isso preciso
conversar) se a beleza de fora toca na beleza de dentro. Eu acho que sim. Tem
vezes que a beleza é tanta que não basta só aparecer no lado de fora. Tem vezes
que a beleza é tão forte que fura a carapaça e penetra no infinito de
possibilidades da parte dentro. Quero saber tudo isso. Quero mas não o faço.
Tenho medo. Sou covarde mesmo. Outros chamam de timidez, mas eu, que não
preciso ser educado comigo mesmo, me chamo de covarde.
Quero saber tudo isso, por que quero entender a beleza e o desejo.
Talvez entendendo-os eu consiga decifra-los e convertê-los a uma equação que me
sirva de base para a minha própria beleza. Já o desejo é mais complexo. Preciso
trabalha-lo para que sirva aos outros. Esse é mais difícil, mas a beleza já é
metade de equação. Um x somado com um outro x e divido por y.
O resultado por ser o fim dos dias de inexistência. Aqueles dias,
como tantos e tantos e tantos outros, que eu não sinto mais. Desisto. Privo-me
de sentir até que deixo de existir. A inexistência acontece lentamente. Chega
devagar e me toma. Somem meus pés e vai subindo. Já é noite quando minha cabeça
desaparece. Aí eu durmo e acordo noutro dia. Acordo existindo de novo.
Existência renovada. Medos renovados. Levanto e não me olho no espelho – tal
como um vampiro. E Dorian Gray, o eternamente jovem. Tomo meu café. Me visto.
Saio para mais um dia devagar. Até a inexistência já faz parte do cotidiano. À
noite, sem existir, eu durmo e replay.
Tudo de novo.
Quero entender essas coisas.
Preciso entender.