Tanta vida em tão pouco tempo, pensou Ele.
Ele – o homem, antes menino, no
passado: criança – lamentava a falta de tempo, o caminhar constante dos
segundos, reunidos em minutos, agrupados em horas, resultantes em mortes. Tanto
a fazer, tanta vida a viver e experiências a sofrer em pouquíssimo tempo. Um
exemplo, ele pensava, estava ali mesmo, diante dele, ao lado dele, dentro dele:
ele havia acordado há pouco mais de uma hora e já estava fora. Fora. Deixara a
mãe com um “até mais tarde” sabendo que até
e mais e tarde passariam rápido demais e que daqui a pouco estaria dizendo “boa
noite” novamente e deitando-se na cama, à espera das horas de sono – o tempo
perdido que ele precisava, era fisiologicamente obrigado a gastar de olhos
fechados, imaginando mundos enquanto toda a realidade e suas horas inescapáveis
corriam lá fora, como crianças brincando de pique.
Acordava todos os dias em torpor e
mantinha-se na ignorância autoimposta da vigília desleixada, cansada, ignorante.
Gostava de viver na profusão de sentidos largados entre o sono e a vigília. Entendia
que ver o mundo através das cortinas alaranjadas das pálpebras fechadas contra
o sol concedia a realidadeum tom límpido e distorcido das coisas imaginadas.
Pessoas passavam em suas pequenas
ilhas de importância e significado. Elas passavam e Ele observava.
No final do dia, voltava ao estado
dos sonhos, escurecendo as pálpebras e admitindo a irrealidade das noites – e a
realidade do sono artificial.
Para acordava noutro dia e pensar: Tanta vida em tão pouco tempo.