segunda-feira, outubro 24, 2011

Conto: Ilusão Pesada

Em um ano de tentativas frustradas de escrita de um romance completo, um conto surgiu. Espero que gostem.



Ilusão Pesada


Sábado. 00:41. Ela me manda uma mensagem me chamando pra sair. Também diz que está com saudades, mas eu não acredito nela, já não acredito há muito tempo. Segundos depois, enquanto olho suas palavras falsas e sexy no visor do celular, respondo de volta. Aceito. É sábado à noite e eu estou me sentindo vazio. Preciso tomar um porre, fumar um baseado e transar. Deixo o vazio para depois, para a madrugada enquanto olho para o teto, deitado ao lado dela na cama.
            Ela não está sozinha, mas eu não esperava ser diferente. Seus amigos são iguais, os cumprimento, pergunto seus nomes e esqueço-os, tudo ao mesmo tempo. Ela está linda, com sua beleza cara e felicidade paranoica, comprada nas farmácias ou contrabandeadas. Eu não a acho bonita. Ela não liga ou sabe esconder bem a tristeza. Gostaria de ser assim também. Ela gosta de mim, o que é uma pena e torna todos os nossos movimentos em direção a madrugada ainda mais tristes e patéticos.
          Nos sentamos um ao lado do outro perto do bar, em volta da pista. Olho para as pessoas dançando e não as invejo, pensando em como são patéticas em suas felicidades supremas e diáfanas. Dançando em uma noite de ilusões pesadas. Ao menos eu sei que estou sendo enganado. Ludibriado por mim mesmo. Conversamos por mais algum tempo, não sei ao certo dizer quanto. Nunca me importo com as coisas ligadas a ela. Durante esse tempo, passo a mão em uma das suas coxas, enquanto seguro, como um cafetão decadente, um copo de vodca pura com cheiro de tristeza e sexo. Ela sorri debilmente e eu retribuo mostrando mais dentes amarelados pelo cigarro. Ela sussurra sacanagens ao pé do ouvido, eu arrepio, seus olhos brilham. Vamos sair dali.
            Antes de irmos para sua casa, fumo um cigarro em frente ao bar. Ela não fuma, mas aguenta, quieta, com o olhar de expectativa. Não falo por alguns minutos, mas acho o silêncio, ali com ela, humilhante demais. Puxo uma conversa, ela só concorda e sorri, até gargalha. Digo como ela está bonita, ela sabe que eu estou mentindo, mas seu sorriso cresce ainda mais. Ela é boa nesse negócio de esconder a tristeza. Preciso aprender com ela.
            No táxi, pergunto se posso fumar, o motorista não responde, mas abaixa o vidro. Ela está ao meu lado, colada em mim, com um braço em volta do meu e uma mão perto da minha virilha, apertando a minha coxa. Eu estou duro, e ela sabe disso. Suas mãos nunca me tocam. Ela quer respeito. Tarde demais.
            Ela mora com a mãe, o que não é surpresa. Já venho aqui há algum tempo. Fumo no lado de fora. Depois, vamos direto para seu quarto. Ela tira um baseado de dentro da uma caixa de musica. Eu gosto de como ela acendo o beque, ainda me olhando nos olhos como uma gata sexy. Sorrio em troca e ela leva o cigarro até a minha boca. Puxo-a para mais perto e deitamos no colchão macio, um cheiro de baunilha e cigarro. Dividimos o baseado até não haver mais nada. Ela já está dormindo, a cabeça apoiada no meu peito. Eu não consigo dormir, nunca consigo na casa de estranhos.
          Preciso mijar. No caminho de volta, acendo um cigarro e olho a movimentação de prostitutas na rua em frente ao prédio onde ela mora. Ela ainda dorme tranquilamente. Volto para a cama e fico deitado, acordado, ao lado dela. Na manhã seguinte, ela acorda e sorri pra mim, com a satisfação do sexo perfeito. Eu também sorrio com a satisfação da ilusão perfeita. A beijo, me visto e vou embora. Na porta, ela me diz até a próxima. Eu acendo um cigarro. 

2 comentários:

  1. Muito bom, nao sei por que voce nao escreveu o livro todo. Continua garoto!!!

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  2. O ritmo me lembrou o Bukowski.

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